ERA DA “PSICOCOLPOSCOPIA”
BRASIL – DUAS, OU MELHOR, TRÊS REALIDADES.

Duas realidades existem em nosso país: pacientes de clínica privada (grupo I) e pacientes do sistema público de saúde (grupo II). Em tempo, vale ressaltar grande grupo intermediário que são pacientes de convênios médicos (grupo III).

Como agir diante de três grupos heterogêneos, onde nosso objetivo é o mesmo, prevenir câncer?

Como?

Tendo como objetivo mor gerar bem-estar físico e mental das pacientes, na medida do possível, algumas estratégias devem por nós ser adotadas para alcançá-lo.

O primeiro problema aparece em relação ao tempo disponível para cada paciente, dependendo do grupo ao qual pertence.

O segundo problema baseia-se no nível intelectual das mesmas, que difere se pertencentes aos grupos I, II e III, sendo que as pacientes dos grupos I e III geralmente pertencem a nível sócio-cultural elevado.

O que torna importante para refletir é que todas as pacientes, independentemente do grupo ao qual pertencem, esperam do ginecologista colposcopista respostas às suas questões, resolução de seus problemas, ouvidos às suas queixas, confiança e cumplicidade.

A cadeira de psicologia médica, geralmente, não foi levada tão a sério por nós na faculdade. Nosso interesse maior era aprender a medicina organicista, freqüentar maternidades e blocos operatórios hospitalares.

De repente nos deparamos com algo para nós desconhecido, quando iniciamos o trabalho nos ambulatórios e consultórios, onde estamos nós e um casal assustado, que marcou consulta urgente porque a mulher morrerá de câncer do colo uterino, por causa de um HPV de alto grau (entenda-se HPV de alto risco, porque mesmo alguns ginecologistas confundem lesão de alto grau com DNA de vírus de alto risco ) que o parceiro passou para ela, sem nada ter contato anteriormente. Enfim, nos deparamos frente-a-frente com um casal em conflito, casamentos desmoronados e um caos psíquico a dois.

O que é mais importante nesse momento: Prevenção de câncer genital ou psicoterapia breve de casal?

Se não conseguirmos apaziguar o pânico, o medo e o conflito afetivo gerado pelo vírus que se transmite principalmente pela via sexual e é importante fator na carcinogênese genital, ao invés de prevenir câncer, iremos contribuir para que ele apareça, pois a resposta imune que tem peso igual ou maior que o HPV na carcinogênese genital é DIRETAMENTE proporcional ao s tatus psíquico da paciente, podendo gerar até mesmo carcinogênese acelerada, se o psique da paciente não estiver em equilíbrio por tempo prolongado.

Ao assistirmos pacientes do grupo I, privilegiadas, cultas e informadas, realizamos a “psicocolposcopia” respondendo às principais questões, explicando sobre a latência virótica que pode existir por muitos anos, fazendo analogia com a virose do herpes simples para que compreendam que o HPV não é obrigatoriamente transmitido pela via sexual, e acalmando-as em relação ao vírus do alto potencial oncogênico em alta carga viral, ao colocarmos a necessidade de resposta imunológica inadequada e de cofatores para que se estabeleça a carcinogênese. Ao mesmo tempo, informamos que o câncer não acontece subitamente e o fato de apresentarem alguma lesão pré-neoplásica, significa que terá tratamento e controle posterior. Portanto, a virose é absolutamente CONTROLÁVEL! Nesse momento, o casal que entrara cabisbaixo se despede sorridente, para jantar a luz de velas, comemorando o desvendamento do “grande mal-entendido”, que poderia gerar várias doenças iatrogênicas, dentre elas, a depressão, que pode alterar o curso de todas as outras doenças concomitantes.

Ao assistirmos pacientes do grupo II, de baixa escolaridade, dificuldade em absorver informações, atendidas em ambulatórios com estagiários, internos, residentes, além de vinte outras pacientes estarem aguardando sua vez, como proceder? Se pudermos dispor de um psicólogo pra realizar o “grupo de sala de esperar” é o ideal, porque ele utiliza os “fantasmas viróticos que elas mesma colocam e vão respondendo de uma só vez as principais questões que são as mesmas:

Se não dispomos de psicólogo, utilizamos linguagem simples para afirmar que o fato de ter doença pelo vírus HPV não significa infidelidade conjugal, porque o vírus pode ficar “adormecido” por anos. Utilizamos linguagem incisiva para afirmar que NÃO terão câncer, desde que não faltem ao controle solicitado após o tratamento. Dessa forma, perdemos o mínimo de follow-up em nosso serviço. Se algumas dessas pacientes requerem mais tempos para “psicocolposcopia”, um médico residente senta-se com elas à mesa ao lado, até cumprir o objetivo de gerar bem-estar mental às mesmas .Em casos extremos, que é bastante rato, as encaminhamos pra o setor de psicologia.

E as pacientes do grupo III? Não temos experiência com esse grupo, mas geralmente têm o mesmo perfil intelectual do grupo I, que gera mais questionamento. Entretanto, o médico assistente não dispõe do mesmo tempo necessário para tantas respostas consecutivas. Também tem outras pacientes aguardando, ansiosamente, sua vez. O que fazer? Não trabalhamos com esse grupo, mas em relação à “psicocolposcopia”, nos parece o mais prejudicado.

Devemos agir . A SBPTGIC (Sociedade Brasileira de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia) pode dar grandes passos. Vamos nos unir. Essa é a grande realidade dos médicos colposcopistas brasileiros, num país de duas, ou melhor, três realidades de pacientes. VALE REFLETIR!


Dra. Cláudia Jacyntho
Texto retirado do livro HPV o vírus do Câncer pelo sexo? Nossa Dúvidas!